quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Do Condado Soteropolitano

A água refratava o barulho das vozes e risos, dando a impressão de que o som vinha do alto.” (John Cheever – O nadador)

Deu uma última braçada, meio esbaforido, outro tanto culpado por ter roubado os parcos 200 metros de treino de borboleta diários. Nadar como exercício literário nunca convenceu ninguém salvo dois ou três convivas, gente com quem se corresponde à distância. Salvar o miocárdio não seria o suficiente e melhor mesmo seria estender um conto de John Cheever até o ponto em que nadar soaria autobiográfico. Nem tanto, e biografia como exercício paleontológico há anos havia cedido espaço para a ficção ambígua que cita livros inexistentes como se estivessem na sua biblioteca. No caso, até tinha os livros. Não tinha era a natação. Expirou líquido e desajeitado, e alavancou a saída da piscina, atento ao fato de que espalhou um jogo desastrado por uma paisagem grande demais para que qualquer plano mais meticuloso e calculado pudesse dar certo. Para que desse certo seria preciso conspirar contra. Decididamente. Não fazer errado, mas agir corretamente com vistas em impedir o exercício do acordo que, todavia ele mesmo havia proposto. De preferência, agir com raiva onde, em qualquer outro momento só pudesse haver carinho.

Sugeriu 10 páginas imaginando que nunca, ninguém aceitaria um jogo desses. Até porque, ninguém lê 10 páginas e redige uma crítica qualquer, ainda que fosse ruim. Já antevia mil e uma formas de reclamação, pedidos de dilatação de tempo e espaço, e mesmo desculpas como a de que 10 páginas seriam muito poucas páginas, não o suficiente para lembrar; de ler. Disso seguiu a proposta missiva: aos domingos. Começaríamos no louvor secreto do dia 11 de setembro, que continha muitos dias em seu amplexo e que, ainda que os olhos se voltem para Nova York ou Santiago do Chile, sugeria muito mais chegando, inclusive às variações nilotas da vida religiosa. O que esperava era operar pelo dissenso que havia nutrido por anos, delicadamente, esperando que a têmpera dos envolvidos na crítica espontânea, que ele mesmo havia orquestrado a precipitação, conduzisse os trabalhos de forma centrípeta. De alguma forma, seria 2666.

O 11 de setembro é uma data sintomática, mas não é ela que importa. Não para participar das regras de jogo. O que é imperativo é o imperativo da Lei, fazer nascer o esforço em uma data envolvente, nebulosa e disponível para o afastamento de todos os demais que, pelo nojo do clichet, evitariam comemorar. O que importa, de outra forma é talhar a Lei, e fazê-la cumprir durante o tempo de Osíris, que não somente havia imposto aos humanos a lei primeira, como espalhou em palha o dom que era, ao mesmo tempo, esforço e trabalho: o fogo. Daí a cocção e a siderúrgica; recuar ao mais longevo, mirar nos deuses, aceitar sua ascendência e envergar os demais mortais como bestas selvagens fazendo surgir um império do mesmo desleixo que o fizeram os deuses ao permitirem-nos o fogo. A idéia grandiloqüente o fez sorrir ao mesmo tempo em que já tramava contra ela mesma. Deveria atentar contra a mesma seguindo-a à risca. Faria como o fogo. Espalharia a mesma lei: 10 páginas. Ofereceria a benesse diferentemente, como o faz o fogo que nem sempre segue o vento, nem sempre atinge a fogueira necessária. Seria 2666. Mas desigual. Para uns, as dez páginas seriam lei. Para outros, o que teriam para se aquecer. Para esses também sobrariam os boatos.

“Recebeu?”

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